quinta-feira, novembro 3

A Imprensa é Livre. Serão os Jornalistas?

Adjútor Alvim*

A imprensa brasileira tem vivido momentos de muita liberdade, sem que o governo federal use sua força para conseguir opiniões favoráveis nos grandes órgãos.  Mas será que esta liberdade é repassada aos jornalistas responsáveis por elaborar os textos publicados ou as empresas de comunicação mantém algum controle direto ou indireto sobre as opiniões de seus empregados?

Fernando B. Silva
No 25 de setembro de 2011, um domingo, Fernando de Barros e Silva fez, na sua coluna da página 2 da Folha de São Paulo, uma análise das impressões sobre o governo Dilma Rousseff. Extraí alguns trechos que me surpreenderam e os comentei no texto abaixo. Curiosamente, no mesmo espaço no domingo seguinte, o autor anunciou sua despedida do jornal (ele será diretor de redação da revista Piauí), o que me fez pensar se, em sua penúltima coluna, ele não teria sido se sentido um pouco mais "livre" para opinar que em suas colunas anteriores.


Análise abaixo feita em 29 de setembro. Clique aqui para ler o original.  


FERNANDO DE BARROS E SILVA
Dilma e o cavalo de Troia
SÃO PAULO – ‘Dilma Rousseff recebeu aplausos generalizados da imprensa brasileira. Veículos e colunistas em geral refratários a Lula e ao PT se derramaram em elogios ao discurso da presidente na ONU. Entre os chamados formadores de opinião, mesmo (ou sobretudo) os conservadores, essa atitude de quase espanto positivo em relação a Dilma -uma espécie de "Oh, muito bem!"- tem sido recorrente.’
Obrigado, Obrigado!!!
Interessante este primeiro parágrafo. Vamos começar bem do começo ‘Dilma Rousseff recebeu aplausos generalizados da imprensa brasileira.’ Parece uma frase neutra, mas é sugestivo que a coluna se inicie com ela porque dá a impressão de que um chefe de governo não pode receber elogios, ou mais ainda, um chefe de governo com a história política de Dilma Rousseff não deve receber elogios generalizados, a ponto de justificarem uma coluna dominical no auto-proclamado "maior jornal do país".
Seria este um dos
"veículos refratários a Lula"
Em seguida uma confissão extremamente surpreendendente para uma coluna de página 2 da FSP: 'Veículos e colunistas em geral refratários a Lula e ao PT'. Veículos refratários ao PT??????? Ora, ora, sempre achei que a mídia fosse neutra e imparcial e as críticas que o ex-presidente fazia aos órgãos de imprensa eram reflexo de um caráter antidemocrático que não convivia bem com nenhum tipo oposição. Não era isso que os 'veículos e colunistas' sempre diziam?
As perguntas tem que melhorar

'Entre os chamados formadores de opinião, mesmo (ou sobretudo) os conservadores, essa atitude de quase espanto positivo em relação a Dilma'Bom, o colunista está dizendo que os formadores de opinião não conheciam o que a ministra mais importante do governo passado pensava? A competente imprensa brasileira não foi capaz de apurar isso durante a campanha presidencial e passar a seus leitores? Ah, desculpem-me, esqueci-me que a imprensa estava preocupada em saber se a Dilma tinha participado ou não de ações armadas, se sabia ou não fazer o sinal da cruz e, principalmente, se a bolinha de papel tinha causado problema algum neurológico no candidato José Serra.  Implicitamente, o colunista nos diz que os formadores de opinião brasileiros são mal-informados e, por incrível que isso possa parecer, continuam sendo reverenciados pela mídia como os responsáveis por iluminar o caminho da prosperidade para a nação brasileira.

Será que ele explicaria o ódio
a Lula da Classe A?
Saltemos agora ao quarto parágrafo: ‘A defesa intransigente dos direitos humanos, a imagem de quem combate a corrupção, o recato e os contrastes com o estilo de Lula - tudo compõe uma figura que é do agrado do mundo social a que pertencemos’Não vou entrar em detalhes sobre o mérito das críticas implícitas a Lula, mas dois pontos chamaram minha atenção nesta frase. A primeira é a presença maciça de elementos que refletem o inconsciente: imagem, recado, contraste de estilos, figura, agrado. Para quem tem o discurso que as classes mais populares votam menos racionalmente e mais baseadas nas imagens que os políticos projetam, é inusitada a idéia que as classes mais “informadas” tomem suas decisões político-eleitorais a partir dos mesmos critérios que tanto condenam no primeiro grupo. A segunda é a admissão de que jornalistas também são parte da sociedade:  ‘agrado do mundo social a que pertencemos’Parece uma frase óbvia, mas novamente surge a idéia de que jornalistas e veículos não são neutros e imparciais, ao contrário do que gostam de apregoar. Junte-se isso ao fato do colunista ter citado 'Veículos e colunistas em geral refratários a Lula e ao PT'. Será que se trata de uma confissão inconsciente das posições da Folha de São Paulo e seus colunistas?
Vade Retro
‘Mas é difícil discernir entre os que gostam de Dilma e os que gostam de gostar de Dilma porque não gostam de Lula. Nesse universo, de cada dez pessoas que batem palmas para a presidente, nove parecem fazê-lo exatamente porque ela seria uma espécie de negação do padrinho. Bom, a velha obsessão com Lula, tudo é definido tendo o ex-presidente como referência.  Nesse caso, ele é usado como o bode na sala para justificar o apoio à Dilma. Implicitamente, o colunista desqualifica os elogios a Dilma, deixando de discutir seus méritos e sim a razão dos elogios dos formadores de opinião e, de certa forma, volta à inusitada, considerando de onde parte, mensagem embutida que os formadores de opinião chegam às suas conclusões de maneira não racional ou, pelo menos, a partir de uma racionalidade não muito bem estruturada.
"Dilma, me esquece! Se precisar de
conselho, vá procurar o FHC
que ele é mais inteligente"
No sexto parágrafo, o colunista descobre a roda: “Diferenças entre eles existem, mas seria ingênuo demais pensar que Dilma e Lula se distanciam ou não estão jogando juntos. Isso não é verdade. Inclusive porque para cada admirador novo que Dilma conquista, Lula não perde nenhum que já tinha.” O colunista chega à incrível conclusão que Lula e Dilma são aliados e não devem entrar em conflito, contradizendo a sempre presente teoria (ou seria torcida?) da mídia que a criatura se voltaria contra o criador. Fico pensando se ele chegou a esta conclusão sozinho ou consultou algum oráculo. E na última frase, o colunista introduz a idéia que parece lhe apavorar. A idéia que a liderança política de Lula leve à conquista de seu último bastião de resistência, a classe média alta do Sul e Sudeste e se consolide com uma força político-eleitoral invencível como nunca dantes na história desse país.
Onde está Luis Antônio
Fleury Filho pra vestir o Lobo
com a camiseta do PT?
Objeto deixado na entrada
do Shopping Higienópolis
Na conclusão, o colunista rasga a fantasia: ’Quem sabe Dilma não seja, à revelia dela própria, o cavalo de Troia de que o PT precisava para conquistar a cidadela da classe média.’. O colunista parece alertar para que a classe média não apoie Dilma Rousseff porque ela seria, na verdade, um ardil desonesto dos vilões do PT para concretizar sua sorrateira tentativa de obter apoio em uma determinada base social. As características anteriormente citadas de Dilma ‘A defesa intransigente dos direitos humanos, a imagem de quem combate a corrupção, o recato’ seriam exclusivamente 
"Prometo levar a capital de volta
para o Rio de Janeiro!"
"Uai, sô, tô vendo uns 3 lobo!
Trabaiá depois de festa é fogo!"
dela e o PT, o autoritário, o corrupto só as estaria usando como ardil político-eleitoral, não fazendo parte de suas bandeiras. O autor usa o termo classe média genericamente e ignora, esquece ou finge esquecer que a classe B já está com Lula-Dilma há muito tempo, assim como a classe A no Norte-Nordeste. O colunista também alerta para a ingenuidade da Presidenta que se presta a este tipo de uso indevido de sua imagem e de suas ações de governo. Parece a estória de chapeuzinho vermelho, PT como lobo mau, Dilma Rousseff a inocente-útil vovozinha em quem o lobo se disfarça para comer a ainda mais inocente classe média, seu objetivo final. O que o colunista deve estar ansioso é pela definição ator para interpretar o caçador. Dois deles voltaram pra casa depois de apanhar do lobo mau em 2002-2010 e 2006. Um outro, que conseguiu derrotar o lobo mau em 94-98, parece não ter forças mais e seu machado, comprado em dólar, o FMI veio tomar. Finalmente, o caçador caçula parece mais interessado no dolce far niente de sua casa de praia.

*Adjútor Alvim é o "Editor" do blog Casa de Tolerância



Segue o texto completo do Fernando de Barros Silva, como publicado pela Folha de São Paulo:

SÃO PAULO - Dilma Rousseff recebeu aplausos generalizados da imprensa brasileira. Veículos e colunistas em geral refratários a Lula e ao PT se derramaram em elogios ao discurso da presidente na ONU. Entre os chamados formadores de opinião, mesmo (ou sobretudo) os conservadores, essa atitude de quase espanto positivo em relação a Dilma -uma espécie de "Oh, muito bem!"- tem sido recorrente.
Não é o caso de retomar os tópicos da sua fala em Nova York. Basta dizer que ficou visível em várias passagens o acento pessoal do pronunciamento. Dilma fez questão de escrever ela própria certos trechos.
O ponto aqui é outro. FHC estava, afinal, certíssimo quando alertou o PSDB, naquele texto famoso sobre "O Papel da Oposição", de que era preciso encontrar formas inovadoras de conexão com as classes médias, caso contrário elas seriam atraídas para o campo petista. O tucano se referia à classe C emergente, com suas demandas novas, mas o raciocínio também se aplica ao eleitor tradicionalmente simpático ao PSDB.
A defesa intransigente dos direitos humanos, a imagem de quem combate a corrupção, o recato e os contrastes com o estilo de Lula -tudo compõe uma figura que é do agrado do mundo social a que pertencemos.
Mas é difícil discernir entre os que gostam de Dilma e os que gostam de gostar de Dilma porque não gostam de Lula. Nesse universo, de cada dez pessoas que batem palmas para a presidente, nove parecem fazê-lo exatamente porque ela seria uma espécie de negação do padrinho.
Diferenças entre eles existem, mas seria ingênuo demais pensar que Dilma e Lula se distanciam ou não estão jogando juntos. Isso não é verdade. Inclusive porque para cada admirador novo que Dilma conquista, Lula não perde nenhum que já tinha.
Quem sabe Dilma não seja, à revelia dela própria, o cavalo de Troia de que o PT precisava para conquistar a cidadela da classe média.

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